[APPLICATION] Programa de Bolsas Artísticas #5 - kikkss.near

APPLICATION
Programa de Bolsas Artísticas #5

Erika Kobayashi / kikkss.near

São Paulo, Brasil (residência fixa)
Fornelo, Vila do Conde, Portugal (de março a julho, anualmente)

REDES SOCIAIS
@klikks (perfil privado, pedido de autorização via DM)
@cerimoniadocha

SITE
https://erikakobayashiworks.wordpress.com/
CV, BIO e portfolio online

STATEMENT
“Trabalho com chá”, é como me apresento, de forma simples e complexa, com todas as contradições, paradoxos, ambivalências e fabulações que posso criar a partir do que a Camellia sinensis (a planta do chá) possibilita de forma transversal à minha existência, resgate da ancestralidade e (re)criações artísticas que passam pelo corpo pela performance:

Culturalmente , a cerimônia do chá é uma expressão estética japonesa que se estabeleceu no século XVI, uma arte tradicional que reúne diversas outras artes e possui uma inspiração poética a ser comunicada em um encontro único que nunca vai ser repetido da mesma forma.

Esteticamente , o ambiente da sala de chá, tanto sua arquitetura quanto o que a compõe (arranjo floral, caligrafia, objetos de cerâmica para servir o chá) trazem materiais naturais e se combinam de forma a comunicar a inspiração poética cunhada e transmitem conceitos filosóficos/estéticos.

Fisicamente , há um rigor na ordem dos movimentos para o preparo da bebida (fluidez, ritmo, abertura para o acontecimento, escuta afinada do tempo-espaço, consciência do corpo, relação entre gravidade e leveza, percepção de movimentos na medula espinhal, ampliação dos sentidos) de forma que isso é comunicado ao público; a bebida também possui componentes que trabalham estados de atenção, presença, concentração e contemplação.

Sensorialmente , é um trabalho que aguça, convida e provoca os sentidos, pois a degustação revela uma combinação complexa de sabores, aromas, texturas/sensações bucais que se revelam em uma narrativa e podem se prolongar na memória.

Afetivamente , a escolha do que a cerimônia/ritual/chá em performance pode revelar objetos de família, histórias, presentes e detalhes imbuídos de um significado oculto, mas que possuem aura e densidade.

Espiritualmente , a cerimônia do chá trabalha a purificação pela água, ou passando-se tecidos sobre objetos, e indiretamente a transformação que acontece em vários âmbitos, desde o processamento até o preparo da bebida, mas que se sente manifesto no ambiente; cabe lembrar que, mesmo sendo uma arte tradicional, tem uma origem sincrética – ao servir de inspiração pra mim, possibilita uma abertura para incorporar elementos diversos, mantendo o respeito por sua essência.

Profissionalmente, a colheita e o processamento de Camellia sinensis acentuam e revelam um repertório de movimentos, a memória corporal ancestral construída, desconstruída e reconstruída, assim como as etapas de transformação da planta ao longo do caminho que ela percorre do campo ao corpo de quem a bebe.

Politicamente , transitar entre algo que minha família nunca praticou, mas que carrego enquanto repertório ancestral, permite a uma artista que é fruto de mais de uma origem cultural (brasileira e japonesa) e possui uma existência racializada (não branca) a jogar com estereótipos, criar estratégias para fabular – vou me fazendo, desfazendo e refazendo em manifesto contra a palavra “delicadeza” que aprisiona a leitura de todas as produções artísticas de corpas amarelas.

certos barulhos / palavras embrulhadas / a seda se rasga

SINOPSE
[amar.ela] surge em 2022 como ensaio fotográfico, um post e um destaque no meu perfil privado do Instagram (@klikks) para veicular stories sobre racialização de corpas amarelas, meus questionamentos sobre o estereótipo da “mulher japonesa” e minha pesquisa artística que inclui chá, ritual, vestimenta, mas vive em mim desde sempre. Sou uma mulher amarela descendente de japoneses nascida no Brasil que já viveu em Paris e Lisboa e, desde 2019, venho anualmente à Portugal durante a primavera colaborar na colheita e processamento de chá verde biológico. Vive em mim desde 2004, quando iniciei minha pesquisa sobre corpo e cultura japonesa (na academia e em práticas de corpo e meditação atreladas à filosofia Zen), ou desde 2011, ano em que fiz a minha primeira aula de cerimônia do chá e passei a pesquisar o chá como bebida, e desde 2013, quando passei a investigar corpo e movimento.

Em 2019, primeiro ano em que participei da colheita do chá (planta muito cultivada no Japão, terra dos meus ancestrais), percebi o potencial de prática artística nos movimentos da colheita e do processamento da Camellia sinensis . O aprimoramento de posturas e o nascimento de gestos ao longo das temporadas corre em paralelo a discussões sobre a invisibilidade de corpas amarelas racializadas e as contradições da minha expressão artística atrelada à cerimônia do chá, uma arte tradicional (que muitas vezes serve como reforço a estereótipos da mulher japonesa) que me atravessa como base e também ruína, expressando-se em um ritual sincrético e estético que mescla performance e instalação, sustentado por uma pesquisa que envolve artes tradicionais japonesas, práticas somáticas, percepção dos sentidos, escuta do tempo, acompanhamento dos ciclos da natureza, plantas de poder e espiritualidade de povos ancestrais.

A não hierarquia entre diferentes corpas e experiências culturais diversas que me atravessam são transpostas à minha criação que se expressa cotidianamente e alinha conhecimento ancestral (cerimônia do chá e seus movimentos, desenho do espaço, vestimentas femininas e masculinas – kimono e hakama – e objetos do ritual), dança, performance, ofício (colheita, processamento e degustação de chá), sincretismo e diálogo com a natureza.

CONTRIBUIÇÃO DA BOLSA PARA O PROJETO
Sustentabilidade financeira para prolongar minha estadia em ao memos dois meses mais em Portugal (junho e julho de 2022), de forma a acompanhar um ciclo completo de colheita (pré-colheita, colheita de primavera e colheita de verão) de Camellia sinensis , a planta do chá e, posteriormente, me dedicar à documentação de experiências e movimentos na própria plantação. Se for possível pretendo ainda realizar viagens para trocas com artistas em Lisboa e Barril de Alva.

TRABALHO ARTÍSTICO QUE ESTÁ A PENSAR A PESQUISAR/
COMEÇAR A CONCLUIR COM ESTA BOLSA
Em continuidade ao trabalho desenvolvido pela performance Confluência , em que o tema da ancestralidade foi pesquisado em colaboração com a artista Juliana Matsumura, pretendo dar início a uma performance solo inspirada pela dança da colheita, a partir do enunciado: “eu me colho, eu me preservo, eu descanso, eu me espiralo, eu me movimento, eu me quebro, eu me exponho, eu me desloco, eu me espalho, eu me grudo, eu me desprendo, eu me seco, eu me ritualizo, eu me sirvo”.

OBJETIVOS

  • Continuidade do processo iniciado com a performance Confluência;
  • Documentação de movimentos/prática de corpo na plantação de chá;
  • Levantamento de materiais para a criação de uma performance solo (negociação de espaço de ensaio com coletivo Trust, em Barril de Alva, Arganil, para 2023);
  • Fomento de discussão sobre não horizontalidade entre linguagens, descentralização de modos de produção e criação, prática artística como pesquisa contínua e não descolada da existência e invisibilidade de corpas amarelas na cena artística contemporânea, especialmente a performance.

VÍDEOS

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